Resilient Gardens é um projeto de residência artística de um mês na Galeria VNBM – arte contemporânea em Viseu, Portugal, com curadoria de Sandra Oliveira.

 

Durante a residência, a artista concentrou-se no conceito de jardins urbanos, explorando espaços naturais como o centenário Parque do Fontelo e o arranjo geométrico de amores-perfeitos espalhados na cidade, bem como na comestibilidade das plantas de Viseu. O resultado dessa exploração pode ser visto em três estudos: Estudo da viola Tricolor, Estudo das Árvores Caídas e Estudo dos Sabores, desenvolvidos em colaboração com especialistas da comunidade de Viseu.

Para o Estudo da Viola Tricolor, a artista utiliza a técnica de impressão natural, na qual as pétalas são prensadas sobre papel para transferir seus pigmentos naturais.

 

Para o Estudos das Árvores Caídas, a artista seleciona vários troncos de árvores (tília, carvalho e faia) do Parque do Fontelo com o apoio científico da Escola Superior Agrária de Viseu. O tronco de tília passa por uma intervenção e serve de base para os sabores, o terceiro estudo.

 

O Estudo dos Sabores envolve a extração de pigmentos naturais, fragâncias e essências das plantas de Viseu, que são então colocados em frascos de spray. Esta instalação multissensorial incentiva os visitantes a serem parte do projeto ao provar esses líquidos coloridos, borrifando-os nas suas bocas. Isso não apenas convida o público à participação, mas também estimula a reflexão sobre a relação entre seres humanos e o mundo natural, a interseção entre a arte e vida quotidiana e a ciência.

 

Árvores Resilientes que Contam Histórias

Paulo Barracosa

 

As três espécies, o Carvalho-alvarinho (Quercus robur L.; Fam. Fagaceae), a Faia-europeia (Fagus sylvatica L.; Fagacee) e a Tília-prateada (Tilia tomentosa Moench.; Malvaceae), todas caducifólias, revelam o cerne da sua identidade, porte e arquitetura quando desprovidas de folhagem. A vestimenta, curiosamente, é muito biodiversa em formas, tons e matizes.

 

Comecemos pela taxonomia e o que nos dizem as famílias e os seus apelidos. A família Fagaceae inclui algumas das mais importantes plantas lenhosas do Hemisfério Norte, que formam a principal componente da floresta temperada húmida, constituindo uma das fontes mais importantes de alimento para a vida selvagem (sylvatica) nas regiões de floresta temperada da Eurásia.  O epíteto específico robur do carvalho apelida a robustez que ostenta a armação que erige uma árvore máscula e majestosa.  No extremo oposto temos a Tília, uma Afrodite arbórea, com o senso da simetria e que coloca todo o desvelo na toilette, assumindo-se como um dos ex-libris da cidade de Viseu e uma das árvores de eleição do Mestre Aquilino Ribeiro que, as plantou no seu pátio beirão e que, privilegiadamente e sentimentalmente, as admirou e descreveu.

 

 

 

A dendrocronologia, representa o ramo da ciência que se dedica ao estudo da datação dos anéis de crescimento e, etimologicamente, vem do grego, “dendros”, que significa árvore, “cronos”, que expressa tempo e “logos” que se refere a ciência. Quando observamos um corte transversal de uma árvore, é possível notar que ela possui círculos concêntricos denominados anéis de crescimento que resultam da atividade de crescimento do câmbio vascular. Um anel de crescimento típico possui duas partes distintas.

O lenho primaveril, com uma coloração mais clara, representa o crescimento que ocorre no início do período vegetativo, normalmente na primavera. O lenho outonal, representa o fim do período vegetativo, geralmente no outono e, normalmente, apresenta uma coloração mais escura. A formação de um anel de crescimento típico é mais comum em árvores que crescem em locais com estações do ano bem definidas, como as regiões temperadas. Já em regiões tropicais e subtropicais essa diferenciação é menos definida.

 

Fatores bióticos, abióticos, antropogénicos e outros podem afetar o crescimento de uma árvore e ficam indelevelmente gravados no cerne como uma fita do tempo de uma qualquer cassete que começa no seu umbigo, mas que irradia para a floresta.

 

Com base na experiência de 25 anos a conviver e avaliar o estado fitossanitário das árvores da cidade de Viseu, permite-nos indagar sobre as causas que permitiram estarmos aqui a admirar a simbiose entre a componente científica de uma anatomia arbórea e a inspiração artística da Marisa Benjamim.

Para memória póstuma das árvores considerámos parâmetros dendrométricos e aspetos da biomecânica das árvores através da realização de sondagens com um resistógrafo na extensão do diâmetro total do tronco.  Sabemos que os elementos arbóreos do Carvalho-alvarinho derivam do exemplar majestoso que estava no parque Aquilino Ribeiro com alguns séculos de existência naquele local e que fomos monitorizando ao longo dos anos até à sua queda, por causas naturais, fruto de um avançado estado de degradação no tronco, em novembro de 2020.

 

A Tilia-prateada proveniente do Fontelo, muito provavelmente, padeceu de um fenómeno típico desta espécie que se apelida casca inclusa e que se regista em zonas de bifurcação com uma ligação estrutural fraca, fruto de uma falha na consolidação, e que em ramos de grande diâmetro aumenta a probabilidade de rutura.

Olhando com pormenor o Carvalho-alvarinho no seu cerne revela-se castanho-escuro de contorno regular e definido com o borne de tom branco-amarelado.

 

A anatomia revela camadas de crescimento distintas, especialmente no cerne, pela variação destacada no diâmetro dos poros de outono para os de primavera. Os vasos de primavera muito grandes, circulares a ovais, solitários, de parede medianamente espessa e quase totalmente oclusos por tilos, no cerne. Os de outono mais pequenos, de contorno mais ou menos poligonal, formando bandas radiais que alargam, em leque, para a extremidade do anel em crescimento. É uma madeira com uma densidade de 710 kg/m3 e uma dureza alta com um cerne de boa durabilidade e o borne sensível a pequenos carunchos.

 

A Faia-europeia revela uma cor amarelo-dourada, sem cerne distinto e medula pequena com camadas de crescimento visíveis e nítidas por tonalidades de cor.

Grão medianamente fino e uniforme e de textura suave e fraca. Veio radial proporcionado pelas camadas anuais e pelos raios, particularmente notados que conferem à superfície um desenho espelhado (madeira flor). É uma madeira moderadamente pesada (675 kg/m3) de secagem relativamente lenta e delicada pela forte anisotropia (fendimentos e empenos). Particularmente sensível ao ataque de fungos cromogéneos e lenhívoros, desenvolvendo-se rapidamente no borne, muitas vezes ainda na natureza.

 

A Tilia-prateada apresenta uma madeira amarela-rosada, sem cerne distinto. Camadas de crescimento moderadamente distintas por uma linha de tecido mais claro ao nível da separação de dois crescimentos contínuos cujas zonas de primavera e outono apenas são notadas por ligeira variação de cor. Raios pouco numerosos, sensivelmente iguais, medianamente estreitos. Madeira muito leve (470 kg/m3), dureza branda e textura muito suave e fraca. Secagem rápida e elevada vulnerabilidade ao ataque de fungos e insetos.